Um caderno de leituras

"esguias Graças, Musas de mais magas tranças,
vinde, vinde agora"

Safo

sábado, 9 de agosto de 2008

PANDORA


Fonte: Wikimedia Commoms

Pandora (1882), de Jules Joseph Lefebvre.

HEINRICH HEINE

Fonte: Wikipedia - licença Creative Commoms
Heinrich Heine
CANÇÕES

LI

Minhas canções têm veneno, -
Não pode deixar de ser,
À minha vida em botão,
Deste peçonha a beber.

Minhas canções têm veneno, -
Não pode ser doutro jeito,
Trago em mim tantas serpentes
E a ti, meu Bem, no meu peito.

Tradução de A. Herculano de Carvalho

DÉDALO E ÍCARO


Dédalo e Ícaro (1869), de Frederick Leighton.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

PHILIPPE DESPORTES


Fonte: autor desconhecido

Philippe Desportes (1546-1606)


SONETO AO SONO

Sono, filho gentil da noite solitária,
Dos animais sustento e pai dispensador,
Doce olvido dos males, gracioso encantador
E, de almas em tristeza, a cura necessária.

Porque tua vontade, dócil, me é contrária,
Deus, que só a mim vês sofrendo maior dor
Quando os corcéis da noite os céus vão a transpor
E enquanto aos outros dás tua graça ordinária?

Teu silêncio onde está? tua paz, teu descanso
E esses sonhos sem fim, nuvens que não alcanço
E que lavam num mar de olvido os pensamentos?

Ó sono, irmão da morte, assim me és inimigo!
Chamo por ti, em vão, que estás adormecido,
E ardo, sempre velando, em frígidos tormentos.

Tradução de A. Herculano de Carvalho

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

LOUISE LABÉ


Fonte: Wikimedia Commoms

Louise Labé (1526(?)-1566)


SONETO


Belos olhos que fingem não me ver
Mornos suspiros, lágrimas jorradas
Tantas noite em vão desperdiçadas
Tantos dias que em vão vi renascer;

Queixas febris, vontades obstinadas
Tempo perdido, penas sem dizer,
Mil mortes me aguardando em mil ciladas
Que o destino me armou por me perder.

Risos, fronte, cabelos, mãos e dedos
Viola, alaúde, voz que diz segredos
À fêmea em cujo peito a chama nasce!

E quanto mais me queima, mas lamento
Que desse fogo que arde tão violento
Nem uma só fagulha te alcançasse.

Traducão de Sergio Duarte

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

AS MUSAS


Fonte: Wikipedia - Licença Creative Commoms

Musas dançam com Apolo, de Baldassare Peruzzi

GÉRARD DE NERVAL


Fonte: Wikimedia Commoms

Gérard de Nerval



VERSOS DOURADOS

Homem! livre pensador! serás o único que pensa
Neste mundo onde a vida cintila em cada ente?
De tuas forças tua liberdade dispõe naturalmente,
Mas teus conselhos todos o universo dispensa.

Honra na fera o espírito que fermenta…
Cada flor é uma alma em Natura nascente;
Um mistério de amor no metal reside dormente;
“Tudo é sensível!” E poderoso em teu ser se apresenta.

Receia, no muro cego, um olhar curioso:
À própria matéria encontra-se um verbo unido…
Não te sirvas dela para qualquer fim impiedoso!

Quase sempre no ser obscuro mora um Deus escondido.
E, como um olho novo coberto por suas pálpebras,
Um espírito puro medra sob a crosta das pedras!


Tradução de Contador Borges

terça-feira, 5 de agosto de 2008

MAURO MOTA


Mauro Mota



ELEGIA Nº 1

Vejo-te morta. As brancas mãos pendentes.
Delas agora, sem querer, libertas
a alma dos gestos e, dos lábios quentes
ainda, as frases pensadas só em certas

tardes perdidas. Sob as entreabertas
pálpebras, sinto, em teu olhar presentes,
mundos de imagens que, às regiões desertas
da morte, levarás, que a morte sentes

fria diante de todos os apelos.
Vejo-te morta. Viva, a cabeleira,
teus cabelos voando! ah! teus cabelos!

Gesto de desespero e despedida,
para ficares de qualquer maneira
pelos fios castanhos presa à vida.

JOAQUIM CARDOZO

fonte: jiraudiverso.blogspot.com
Joaquim Cardozo



SONETO DE VIDRO

Este ser que se compõe de adjacências,
E de um cimento claro e matinal,
Tem nos seus nervos finos transparências,
De luz se alimenta. Fala cristal.

Por seu través mantendo as aparências,
Da limpidez é símbolo e sinal;
Meu coração, por essas excelências,
Nele se mira e se vê por igual,

Nele se ajusta, assim como vertida
Onda de anseios vagos e dispersos
Que um sopro dual juntasse em verbo e vida.

Lendo-o com precaução modesta e ágil
Cuidado tenham no seguir seus versos
Que este soneto é de matéria frágil.

domingo, 3 de agosto de 2008

Ninfas


Fonte: Wikipedia - Licença Creative Commoms

Caverna das ninfas da tempestade, de Sir Edward John Poynter


ASCENSO FERREIRA


Fonte: raimundopajeu.blogspot.com

Ascenso Ferreira


MÊS DE MAIO

O altar de gazes adornado,
parece um ninho de noivado...

E a gente chega a interrogar
se Nossa Senhora vai casar...

Um perfume de rosas no ar trescala:
- São as rosas de carne que há na sala.

Rosas morenas,
rosas louras como espigas maduras.
- Ó perfumosas
e puras
rosas pálidas como açucenas!
Súbito, ecoa no espaço um som:
Kirie eleison... Kirie eleison...

E as bocas carminadas rezam baixinho...

baixinho:

"Ó Mãe castíssima!
Ó Vaso espiritual!
Ó Espelho da Justiça!
Ó Rainha concebida sem pecado original!
Ó Consolação dos aflitos!
Ó Senhora dos Infinitos!
Ó Torre de Davi!
Ó Estrela da Manhã!
Ó Escada de Jacó!
Ó Rosa de Sião!
Ó Lírio de Jericó!
Ó Rainha Cristã!

Ó!...

Rogai por nós
que recorremos a vós..."

Um perfume de rosas no ar trescala.
- São as rosas de carne que há na sala.

O incenso queima diante do altar;
o mês de maio vai terminar...

Com seus deliciosos braços nus,
as rosas fazem o sinal-da-cruz...

Amém...