A CASADA INFIEL
   A Lydia Cabrera
   e à sua negrinha
    E eu que a levei até o rio
    achando que era donzela,
    mas ela tinha marido.
    Foi na noite de Santiago
    e quase por compromisso.
    Apagaram-se os lampiões
    e se acenderam os grilos.
    Pelas últimas esquinas
    toquei seus peitos dormidos,
    que a mim se abriram de pronto
    como ramos de jacintos.
    A goma de sua anágua
    ao meu ouvido soava
    como uma peça de seda
    lacerada por dez facas.
    Sem luz de prata nas copas
    as árvores têm crescido,
    e um horizonte de cães
    ladra bem longe do rio.
    *
    Passadas as amoreiras,
    os juncos e os espinheiros,
    para abrigar seus cabelos
    fiz um ninho sobre o limo.
    Eu tirei minha gravata.
    Ela tirou o vestido.
    Eu, o cinto com revólver.
    Ela, seus quatro corpetes.
    Nem flores nem caracóis
    têm uma pele tão fina,
    nem os cristais sob a lua
    resplendem com um tal brilho.
    Suas coxas me escapavam
    como peixes surpreendidos,
    metade cheias de luz,
    metade cheias de frio.
    Naquela noite trilhei
    dos caminhos o melhor,
    montado em potra de nácar
    sem rédeas e sem estribos.
    Não vou dizer, por ser homem,
    as coisas que ela me disse.
    A luz do entendimento
    me faz ser mais comedido.
    Suja de beijos e areia
    levei-a embora do rio.
    Ao vento se digladiavam,
    no ar, as espadas dos lírios.
    Portei-me como quem sou.
    Como um gitano legítimo.
    Dei-lhe um cesto de costura
    grande, de raso palhiço,
    e não quis me enamorar
    porque, tendo ela marido,
    me disse que era donzela
    quando a levava até o rio.
 Tradução de Fábio Aristimunho
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